Friday, May 08, 2009

eu, julia, e os livro de auto-ajuda.

Meu texto no Pernambuco novo. Comprem. Acho que vende na Cultura. E vem dentro da Continente Multicultural também (a revista).


vamo dividir um bife, má julia?

§

Quando Schneider me pediu para escrever sobre Comer, rezar, amar, a primeira coisa que eu falei foi: “Você poderia, por favor, me mandar um exemplar do livro e assim me eximir da missão ridícula de ir até uma livraria para comprar um livro de auto-ajuda?”. A resposta, claro, foi “não”. Acho que ele queria que essa vivência fizesse parte da pauta!

O ponto é, querida leitora: a gente sempre acha que nunca vai passar por isso, mas tenha a certeza: vai chegar a hora em que você vai pedir ajuda até a livro de auto-ajuda. E eu não sabia ainda, mas minha hora tinha chegado.

Munida de uma cara de tabaco, cheguei à Fnac me fazendo de desentendida: “Oi, eu tô procurando um livro para dar de presente, não sei o nome direito... Comer, beber, viver, talvez?”. Os olhos da vendedora brilharam de entusiasmo e, mesmo sem eu ter dito o nome certo, ela me levou direto àquele que procurava: “É este aqui, ele sai bastante, faz meses que fica entre o primeiro e o segundo da lista de mais vendidos”. Ela era puro entusiasmo.

“Ah, é? E você, já leu?”. “Sim, duas vezes, é maravilhoso”. “Então me conta, mulher: porque livro de auto-ajuda assim faz tanto sucesso?”.

Nesta hora recebi um olhar de reprimenda da vendedora. Que prosseguiu, já bem menos simpática: “Olha, se você ler a sinopse vai ver que se trata de uma autobiografia”. Quase pedindo perdão pela minha gafe literária, agradeci e peguei o livro. Impressão 1: que capa horrível. Impressão 2 (ao ver a foto da autora na orelha do livro): que cara de americana. Impressão 3 (ao ler a contracapa): se Julia (Roberts) gostou, eu gosto também!

Por conta do aval de Julia, minha querida Julia, cheguei ao caixa com outra atitude. Vergonha de comprar aquele livro? Jamais: não se trata de um exemplar de auto-ajuda qualquer, e sim de uma nobre biografia sobre superação, escrita por uma mulher, e que tem o aval de Julia Roberts (e Hillary Cliton!).

Pois que Comer, rezar, amar é mesmo maravilhoso. Elizabeth Gilbert, sua inspirada autora, fala sobre tudo aquilo que a gente gosta: coração partido, viagens, reflexões esperançosas e caubóis (no caso, um só, mas já está bom demais, uma vez que o roteiro não incluiu Oklahoma e, dado que ela só perambulou pela Itália, Índia e Indonésia, foi uma sorte danada ter encontrado um Jesse James). E tudo na primeira pessoa! Quão inexplicável é o deleite proporcionado por um autor que se entrega assim? Se Dostoievski tivesse escrito em primeira pessoa um livro sobre ele mesmo (Recordações da casa dos mortos não conta, porque não ajuda ninguém) eu seria uma Adelaide Ivánova muito mais... Ivánova?

Liz saiu dos EUA rumo a uma viagem de um ano, para se recuperar de um divórcio e de um ex-marido muito pouco digno (devia ser escorpiano, de tão vingativo). E o que fica muito claro é: não importa quão longe a gente vá, a trip mais importante de todas é a que a gente faz para dentro. E, de fato, Liz fala muito sobre as coisas que ela descobriu sobre ela mesma (principalmente quando ela conta sua experiência no ashram indiano). E que são, no fim das contas, as mesmas coisas que todo mundo pensa quando está com o coração partido.

Existe uma passagem muito especial no livro, que ensina sobre desapego, e eu vou reproduzir aqui para vocês porque somos amigas:

“(...) ele foi ótimo, mas agora acabou. O problema é que você não consegue aceitar isso, que esse relacionamento tinha um prazo de validade bem curto. Você parece um cachorro cheirando lixo, baby... Fica lambendo uma lata vazia, tentando tirar mais comida de lá de dentro. E, se você não tomar cuidado, essa lata vai ficar presa no seu focinho para sempre e tornar sua vida infeliz. Então largue isso”.

Existe uma prepotência cruel e egoísta nas pessoas que usam a própria experiência para dar conselho às outras. Porque, geralmente, a conselheira é uma destrambelhada completa, às voltas com o desmantelo que é a sua própria vida emocional e que, sabe-se lá por quê, enquanto relata sua experiência em busca de entender a própria confusão, acaba inspirando outras pessoas. Mas se você partir do pressuposto que só se ensina o que se sabe, conselheiras amorosas são a raça mais sem-ter-para-quê que existe. Elas fazem análise com seus leitores, num exercício de falar-sozinha bem perverso, já que as leitoras não são Freud nem são pagas para ler essas baboseiras. Um dessserviço, portanto.

Eu mesma tratei de matar a Dra. Vodca quando me dei conta que seria muito mais útil se me calasse – de certa forma, duas mil pessoas por dia se tornaram dependentes do que eu tinha a dizer e eu, ora bolas, nada tenho a dizer a não ser “pelo amor de Deus me ajude”.

Só que no caso de Elizabeth foi a viagem em si, e não o seu relato, que ela usou para se ajudar. E no fim das contas, o que ela aprendeu neste longo percurso ajudou um montão de gente (incluindo eu mesma). Não por ter frases elucidativas e incentivadoras, tão chatamente típicas de livro de auto-ajuda. Mas porque a leitura de Comer... proporciona um respiro depois de um de um dia difícil; é uma dose de doçura na vida ler sobre a simples experiência de comer uma pizza em Nápoles. O livro de Elizabeth Gilbert é tão gentil com a gente como um filme de Julia Roberts. E não por acaso, será ela a protagonista da versão para o cinema de Comer, rezar e amar, com estréia marcada para 2011.

Um final perfeito para aquilo que um dia começou apenas como mais um coração partido.

9 comments:

Márcia Mesquita said...

sabe que uma vez o Ela publicou uma matéria de capa sobre o livro, autora e pessoas apaixonadas, eu fiquei super curiosa, mas acabei esquecendo. mas agora vou comprar, com aval de Julia e Ivi

Só não curti a sua observação sobre escorpianos. Eu sómefodobrasil e sou zuper do bem! heueuhaeuhaeuh

calo são os aquarianos e geminianos

Unknown said...

Ivi,

adorei o seu texto, mesmo.


Beijos.

Vaneça said...

acho muito bonitinhas as coisas que vc escreve aqui. depois que descobri esse blog, venho todo dia.

também nunca comprei um livro de auto ajuda (apesar de eles pipocarem na minha casa cheia de mulheres), mas tô inclinada a ler esse depois do que vc disse :)

num estilo vamo dividir uma auto ajuda, ma beibe :P

Alessandra - Lain said...

li seu texto com prazer! espero ler o livro nas férias.

Nanda Coelho said...

Ivi,
Eu li o livro e é realmente contagiante....
com certeza o filme será sucesso.

Z. said...

Lindo texto, amoure!

Muito bom ler um texto tão bem escrito e que define exatamente o que é o livro de Liz Gilbert. Eu li e tb. adorei!

Bjsssss Felpudos, Z.

Bri said...

já mandei o link para minha mãe - taurina e super erin brocovitch - que ganhou o livro de niver e tá amando!

Bri said...

by the way texto maravilhoso, tinha que ter sido escrito por uma leonina mesmo ahahah

Alda Ribeiro said...

Oi Ivi, nossa lendo teu texto lembrei que conheci a autora desse livro dando entrevista na Oprah, achei a estoria dela super interessante! a trajetória de uma pessoa que percebe beleza nas coisas pequenas e simples da vida :) bjka