15. o último dia, já exausta, pela primeira vez em meses desejando alguma coisa familiar. decidi não voltar pra casa depois do jantar, virei à esquerda. se eu pudesse desejar alguma coisa, desejaria que são petersburgo tivesse um rio que durasse a vida inteira, em cujas margens eu pudesse sair andando até desistir.
mas o fontaka tem fim, e eu não sei exatamente onde é. só sei que dei meia volta quando joguei o anel mágico de jana no rio.
1. moscou cheira a fumaça e eu não quis nem fumar. lá de cima já dava para ver que algo muito errado rolava ali.
2. já no aeroporto de são petersburgo me embananei: no balcão de informações do aeroporto internacional, as atendentes não falavam inglês.
3. consegui sacar rublos, muitos rublos. que moeda fraca: 6 mil rublos duram uns poucos dias. com seis mil reais eu vivo seis meses. peguei um táxi e fui assaltada.
4. explico: o moço, muito charmoso e simpático, cobrou OITOCENTOS RUBLOS por um trajeto que (depois me explicaram) ele devia ter cobrado cinquenta. ok. talvez ele estivesse precisando.
5. o hostel era na esquina da nevski, uma avenidona em são petersburgo que dostoievski tanto falava. e o prédio em que ele ficava era bem dostoievskiano: sujo, escuro, fedido, com goteiras, sem luz, com bêbados rolando escadaabaixo e uma mochileira deslumbrada.
6. a rússia tem a maior concentração de gente sem dente e mulheres com unhas postiças que já vi na minha vida.
7. alexander sdifhodifvjosvki era da sibéria. eu o conheci quando sai para jantar, na minha penúltima noite. ele tinha o tamanho de marcelo gomes e quis me levar pra passear. eu neguei: com um homem daquele tamanho eu corria sério risco de virar patê. mas ser paquerada por um autêntico siberiano me fez sentir bem especial.
8. o outro menino que me paquerou era de kaliningrad e eu achei que ele tinha dentinhos separados como o meu, mas não: faltava um incisivo, mesmo.
9. sentei do lado da catacumba de dostoievski e batemos o maior papo. eu tive que confessar pra ele que a rússia era um sonho, não um objetivo, mas por causa dele. é sempre assim, rapaz: eu, indo pra puta que pariu por causa de um homem.
não obtive resposta.
10. clarice diz que a gente existe a partir do momento em que ganha um nome. eu portanto existo desde 1878 e deve ser por isso que ando tão cansada.
11. a experiência do analfabetismo é exaustiva. eu sempre fui para lugares em que falo minimamente a língua, mas a impossibilidade de ler é violenta: você precisa de ajuda para escolher comida, pegar um ônibus, comprar cigarro.
é a antítese de christina.
12. a ponte kokushkin most é onde raskolnikov (o tabacudo de crime e castigo) parou para pensar se ia matar a véia ou não. ele ficou lá um tempão pensando as merda dele.
eu, morrendo de calor e vontade de ser salva, perguntei ali a mim mesma: se eu tivesse de, aqui, como raskolnikov, tomar a decisão da minha vida, qual seria?
(silêncio).
13. o hermitage é um museu grande demais e sem ar-condicionado no qual você não dá a menor bola pros dançarinos de matisse porque, puta que pariu, que calor do carai.
14. joguei o anel mágico de jana no rio e decidi qual seria a grande decisão da minha vida como raskolniokv na rússia tomada. inspirada numa frase do próprio dostoievski, em carta pro seu irmão, decidi: "a vida é vida em qualquer lugar".
(16. ok, eram 15. mas o fato de que eu matei armin me faz querer começar tudo de novo, numa novela em que ele esteja vivo para que assim eu mesma encontre sentido em existir.)
Tuesday, August 17, 2010
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2 comments:
Que loucura de vida!!! Vc foi pra Russia buscar respostas e o que vc trouxe na mochila foram mais perguntas... essa é a tendência das pessoas inteligentes como vc. Quanto ao item 8, achei muito engraçado!!! Beijos.
Curiosidades interessantes e engraçadas!!!
Me diverti lendo isso...
Só n com a 16.
=**, Jowzinha
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