para mim é impressionante que o slideshow de 100 men pôde causar tantas reações - tão positivas e tão negativas.
quando ricardo me chamou para ocupar o subsolo do NBI, eu inicialmente quis fazer uma instalação toda com fotos, vídeos e emails de armin. depois, não lembro bem como, tive a ideia de fazer a instalação tal qual acabou sendo: uma projeção sobre lençol, com 100 retratos de meninos.
eu digo "de meninos" porque é isso a única coisa que os une: são meninos. porque de resto, cada um tem seu papel: alguns são meus amigos, alguns são ex-namorados, um é o amor da minha vida. outros, apenas meninos bonitos que cruzei numa festa, num backstage de desfile, na rua.
tem um monte de vida, ali - a minha.
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eu estive pensando nos dois momentos de tensão que 100 men causou, sob duas óticas: a da experiência pessoal e da fotografia.
1. antes de mais nada, 100 men é meu depoimento (ok, talvez lírico demais para ser entendido assim) contrário a tudo aquilo que se espera de alguém vítima da violência masculina.
mais comumente, esperam que a gente endoide, ou se esconda, ou se interne, ou se mate, ou passe a vida inteira se culpando (ou se desculpando) por algo que, ora ora, não é nossa culpa.
eu não tenho culpa de nada. eu não tenho vergonha de nada. eu sou hoje o que era antes:
o corpo masculino é lindo e eu continuo interessada nele. e i want to praise aqueles que de mim se aproximaram com meu consentimento.
eu fiz 100 men foi para dizer: "não doeu".
2. as duas pessoas que reclamaram que suas imagens foram usadas têm direito de não querer aparecer, logicamente. mas eu, que sou uma guerrilheira pelo direito de se descobrir, acredito que a atual defesa da intimidade é muitas vezes baseada em conceitos machistas e na ignorância em relação aos rumos que a arte (e a vida!) vem tomando.
quando eu digo machista é porque o foco da atenção, tanto para quem fotografa quanto para quem é fotografado, é sempre a mulher.
A) se ela é fotografada, a pergunta intrínseca sempre é: "como ela aparece?". ela se dá ao respeito, ela se coloca mais como persona do que como ser humano? (só se ela vestir a persona da vênus de ticiano, a musa branca da pureza, ela se protege. é por isso que o termo que eu mais odeio no mundo é o tal de "nu artístico". na verdade, esse termo quer dizer "nu machista", em que só é bonito aparecer nua se você aparentar, afinal, como uma virgem).
B) se uma mulher fotografa um homem, existe instantaneamente uma tensão. uma sensação de "mas por quê ela quer deixar claro que faz essas coisas?".
o foco, afinal, é sempre o papel desempenhado pela mulher, como artista ou como objeto. posso citar um exemplo bem recente em relação a isso: francilins, no pef, mostrou uma foto super-close up de um quiquito arreganhado, e todo mundo ficou passado muito mais pelo quiquito em si (que era bem feio!) do que pelo contexto (ela, uma prostituta, fotografada por ele, um homem religioso). se fosse uma foto feita por uma mulher de um homem pau duro, não importa como este pau fosse - o pensamento seria for sure "olha, ela trepa!".
além dessa visão macho, tem a questão da "intimidade". eu não sei o que é intimidade. pra começo de conversa, a intimidade morreu com o barateamento da construção civil: eu nunca nem vi a fuça do meu vizinho mas, com essas paredes finas do caralho, eu sei até a hora que ele empalita os dentes.
meu interesse no conceito de intimidade é construir uma entre mim e quem eu fotografo, isso sim. algumas fotos de 100 men não são de momentos íntimos, mas sim de momentos de profunda intimidade. entende a diferença?
eu particularmente acredito que, no momento em que a foto é feita, aquilo vira ficção. não é mais íntimo, é um conto, porque a vida acontece dentro da vida, e não fora dela. uma foto, como diria annie leibovitz, é apenas uma anotação sobre a vida.
às vezes tem gente, tão egolombrada como eu, que acha a própria vida interessante o suficiente pra virar ponto de pesquisa. nan goldin é genial em falar nessa questão: nosso interesse não é expôr a intimidade, é tentar falar de uma experiência coletiva dentro de um contexto histórico, mas saindo de um ponto de partida privado.
com tanto fotógrafo se aproveitando da vida dos outros pra fazer dinheiro, eu não vejo problema em me aproveitar da minha própria - e eu não ganho nem um real com isso hahahaha. já falei sobre isso antes.
3. depois de tudo isso dito, queria dizer que este slideshow é uma declaração de amor.
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realmente, a tal da "intimidade" fez coisas horríveis pela fotografia:
lina scheynius
marcelo gomes
cia de foto
imogen cunningham
robert mapplethorpe
timo klos
heinz peter knes
marianne breslauer
annie leibovitz
brett lloyd
ps: eu sei que vocês odeiam armin, mas eu não. quando ele ficou sabendo da instalação (eu não falei nada para ele, porque estávamos sem nos falar; ele descobriu porque é meu fã e faz meu clipping hahaha), ele me ligou e disse: "achei lindo, e me sinto honrado de fazer parte deste projeto". vale ressaltar: armin é enfermeiro sem curso superior que cresceu numa cidade de 800 habitantes na bavária. mas ele é sensível. ou simplesmente tolerante.
16 comments:
Não odeio Armin. Odeio o comportamento dele às vezes só. Mas em compensação admiro ele ter falado com vc sobre a exposição :) Mostra a admiração e o respeito que ele tem por vc (ainda que só como artista).
Eu gosto tanto do jeito que vc fala das coisas complicadas e eu entendo tudinho. Eu queria que vc me explicasse tudo do mundo pq eu tenho certeza que eu ia entender :)
N sei o q dizer de td isso!!!
É td tão verdade e
tão importante.
Só sei q n tenho ódio de armin.
N se pode odiar o q n se amou!!!
=**, Jowzinha
Não odeio Armin, odeio o sofrimento que ele lhe causou. Mas tudo o que você fala sobre ele mostra que Armin realmente é uma pessoa especial. De modo geral quando uma relação acaba os moços pouco ligam (no sentido de importar, não do telefone) pra gente. Parece que Armin não perdeu a admiração por você, mesmo a relação não dando certo. Isso é dificil de encontrar nas pessoas de modo geral
engaçado, eu não odeio armin. (não ainda)
e achei tão bonito isso, da fotografia ser uma anotação da vida e da vida acontecer dentro dela mesma, e não fora - em forma de registro.
fiquei feliz por ter anotações de vida feitas por você aqui na minha casa. ;-)
você é demais, minha amiga. obrigada por me ensinar tanto.
Ivi,
Acho que estou com Tássia. Queria que vc me explicasse todas as coisas complicadas do mundo, porque tenho certeza que eu ia entender tudo direitinho... Amo a forma simples que vc acessa e descodifica coisas tão complicadas!
Beijos!
Eu odeio armin só de vez em quando. Só quando vc tá aí chorando e eu tô aqui com minha cara de cu sem poder fazer nada. Mas eu gosto dele quando o vejo em foto. Na verdade eu só faço dele um bode espiatório pra ter quem xingar mentalmente e ficar com a sensação de que vc não tá mais triste. Como quando a gente chama uma quina de parede de feia, chata e boba quando uma criança dá uma topada nela e chora. Hahaha!
Ah, liga não, sou geminiana.
Beijo!
Oi, Ivi! Eu também não odeio Armin, não gostei nada foi do jeito que as coisas entre vocês terminaram (?), a forma como ele agiu contigo. Mas, com certeza, pelo que falas dele, é uma "pessoa única". Alemães, em geral, são mais metódicos, planejados, etc, o que os acaba deixando mais "frios", em nossa visão; só pelo fato de ele querer ir a Portugal para conhecer a terra do Fernando Pessoa (é isso, né, foi uma das razões para vocês se conhecerem, certo?) e acompanhar o teu trabalho depois de um término complicado, mostra que ele tem sensibilidade sim, talvez só falte desenvolver em alguns aspectos, é só o que me parece. Mas, com certeza, tu tens muito mais propriedade para entender o relacionamento de vocês do que eu, né, que só acompanho, de longe, as tuas reflexões. Ai, queria ser tão sabida quanto tu és, algumas vezes. Beijos, uma ótima semana!!!
Às vezes eu passo por aqui só porque adoro o jeito que você escreve, e daí quando você faz reflexões como essa vale mais a pena ainda.
Beijo de uma fã!
O post é grande, não vou falar sobre Armin. Vou falar que, em dado momento, parei de ler pra chorar um pouquinho.
Quis te mandar um email, quis te ligar, quis sentar num bar, num café, na grama, e beber alguma coisa e conversar. Porque, por mais que eu diga que não doeu, ainda dói e não sei lidar. E eu engrosso o coro: queria que tu me explicasse as coisas complicadas, tenho certeza de que eu ia entender ou, no mínimo, encarar de outra forma.
(meio que tô querendo muita coisa)
Um beijo.
voce disse tudo o que eu sempre pensei sobre intimidade, ponto de vista do fotógrafo e o contexto de tudo isso.
brigado por esse texto. adorei!
Oi Ivi, gostei da definição de momentos íntimos e não de intimidade. E sobre o ódio do Armin, o mais importante disso tudo é vc não odiar-lo, se vc conseguiu perdoá-lo sinal que vc é uma pessoa boa de coração, e que no final conseguiu tirar lição da vida e ainda entender a situação dele. E com isso mais aumenta minha admiração por vc. Beijosss.
Ivi,
Eu tenho uma dor tão parecida e um amor ainda tão grande. As vezes parece que sou uma parte sua. Eu me vejo nas suas fotos, nos seus posts... Calma, eu não sou louca ou psicopata, não. É só que é como eu fosse tua amiga a tanto tempo...
Obrigada por esse blog.
Caralho, eu escrevi espiatório em vez de expiatório. BIZARRO! É o que dá ficar enviando comentário bêbada de vinho...
Eu não odeio Armin. Ele é alemão. Todo alemão é complicado e esquisito (eu sei, eu venho deles).
Eu amo você, isso sim! Você é uma graça!
Eu amei a idéia da exposição e tudo o que você disse também.
Beijo!
eu ainda não sei o que sinto por Armin. tô é vasculhando a vodca da miudinha giganta! MENINA!!!! HAJA CARACU, SUCRILHOS E SHAKIRA AMBIENTAL! agora é um volta pra mim desde 2009!
te amo diacov!
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