Sunday, March 27, 2011

o vodca é um romance

baudelaire ele tinha exatamente 18 anos quando do nascimento da fotografia. e disse sobre ela:

"Agora o público diz a si próprio: 'A fotografia nos dá a total garantia de exatidao que desejamos'. E esses idiotas realmente acreditam nisso!"

e continuamos acreditando, né?

só que a gente conversa tanto sobre a linha entre realidade e ficcao, sobre o papel social da fotografia, sobre o fato de que a fotografia é apenas um recorte da realidade e assim sendo nao pode ser a realidade.

mas ninguém gosta de falar do espectador. o que ele quer ver? como ele quer ver? e se a pessoa quiser achar que aquilo que foi fotografado aconteceu daquele jeito e pronto?

por que nao? criamos a ficcao e invadimos a mitologizacao dos outros!? que despótico.

eu pessoalmente tendo a crer que se algo foi (d)escrito, fotografado, filmado; se já aconteceu (mesmo sem registro), meu bem, nao é mais realidade. perdeu, já era. mas se tem gente que acredita em meritocracia, por que nao se pode acreditar que a foto mostra o que aconteceu tal e qual aconteceu? deixa o povo achar!

esse mesmo dilema sempre se me aparece quando escrevo. meus textos nao sao uma autobiografia. meu blog nao é um relato. é tudo romance. se nao aconteceu com vocês, e sim comigo, e se já passou e só quem viu fui eu, e se eu conto, entao é ficcao. um texto, uma foto, que seja.

"Sou uma persongagem
de ficcao científica
escrevo para me casar"

adília lopes

mas a fantasia é de quem lê, de quem vê a foto. se o leitor de jornal se sente mais participativo na história da humanidade por ter certeza que "viu um pouco" do que se passa na líbia através das fotos sem graca que têm sido feitas, deixa estar. cada um é individual. e se vocês querem crer que realmente armin cancelou o casamento por email (ui, agora deixei vocês confusas, hein!?!? hahaha), podem crer também.

"Auch die Wirklichkeit muss geformt werden, will man sie zum Sprechen bringen"
=> A realidade também deve ser criada, caso se queira falar sobre ela.
friedrich dürrenmatter

exatamente, seu friedrich. com isso, pergunto: existe algo mais real no mundo do que os contos-foto de sohpie calle? eu adoro que o título de um dos livros dela é "histórias reais", acheo meio cínico. independente daquelas coisas terem acontecido (com ela) ou nao, os acontecimentos que ela descreve sao tao universais, sao tao possíveis, que assim para mim nao existe obra de ficcao mais documental. nao há mais realidade em outro trabalho fotográfico (fotográfico?!) do que naquele.

sei que vocês nao tao nem aí pra essas minhas baboseiras, mas mandei hoje umas fotos pra uma convocatória de livro, e fiquei pensando como as coisas que eu fotografo sao bonitas hahaha nao quero perder isso por ter me perdido na vontade de ser mais sabida pra poder ser aceita.

10 comments:

Marta said...

Eu tava com saudade desses seus textos... "meus textos nao sao uma autobiografia"... outro dia expliquei isso pra umas pessoas, mas elas não acreditaram, se decepcionaram até. Talvez eu tenha arranhado o que elas adotaram como realidade a partir do que escrevi ou talvez eu não tenha talento pra me fazer entender, pode ser.

Natalia Venturini Pessutti said...

Oi Ivi, como sempre adoro te ler. Seus textos fazem falta e concordo com o que vc disse, mas prefiro pensar na minha mente romântica que não foi um romance e sim relato tudo o que vc viveu, fica mais humano, pois sempre me emociono com as coisas que vc escreve. E essa noite sonhei com vc, que te encontrava pessoalmente e que vc me deu um abraço tão apertado como se pedisse ajuda. Acordei angustiada, pensando que pudesse ter acontecido algo com vc. Espero que esteja tudo bem. Beijosss querida, que vc seja muito feliz por aí.

vodca barata said...

eeita deve ter sido porque eu tô vomitando desde quarta-feira, realmente preciso de um colinho, nat!

marta! :*

Anonymous said...

eu não entendi muito bem não, quer dizer, eu entendi a parte da sua ficcção pela história não ser nossa. mas não passa de ser uma realidade. uma realidade bem bonita. adoro ler o que tu escreve
é livre
sem frescurinha e mimimi

Barbara said...

eu penso assim, ivi, que a coisa pode não ser verdade, mas é verossímil. ainda mais porque eu estudo história. e me gusta la fotografía.

Mayara Pascotto said...

Quando eu tinha 14 anos fui violentada por um conhecido.
Conhecido: Indivíduo com quem se mantêm relações superficiais.
Pessoas que sabem disso: Meu irmão, minha tia mais nova.
Ações tomadas sobre o ocorrido: Nenhuma. Eu não soube como agir, eu não soube como pedir ajuda. E até hoje eu não sei como falar sobre isso.
E isso é um relato.

E esse relato só tomou forma, palavra por palavra, depois que comecei a te ler Ivi.
A ler essa tua ficção.
Teus textos, tuas palavras, tuas exarcebações emocionais, exaltações feministas e opiniões.
Como tua leitora, me identifico.
E são tuas palavras que participam da minha vida sem tu nem saber.
E me deram voz para um tantão de coisa que eu nem sabia que tinha voz. E visão. E saber.
E é isso.
SUA LINDA!

The dignity of movement of the iceberg said...

as nossas verdades sao as mentiras dos demais e vice versa; eu adoro quando as tuas mentiras sao as minhas verdades!

Priscilla said...

eu adoro quando as suas verdades são as minhas verdades e de tantos mais...

bjs,

laura said...

não publica, ivi.

sei que temos amigos em comum, embora nao te conheça. infelizmente me falta a imensa fortaleza da maiara..

mas é só pra dzr que aconteceu com a maiara, aconteceu comigo, aconteceu com você.. enchi os olhos ao ler o post..

não precisavamos ter passado por isso.. leio muito sua ficção. e ela se torna extremamente real quando a gente se identifica e quando passou por algo semelhante, (in)felizmente.

tbm nunca falei sobre isso.. só queria desabafar esse sentimento de nao saber o que fazer nem em quem confiar. e do absoluto milagre de sermos pessoas boas, legais, e não sairmos com uma 38 matando toda a humanidade. (que as vezes parece de uma feiura infinita)

pq essa droga, esse mundo é assim..? me dá um desespero saber que agora mesmo pode estar acontecendo algo parecido..

uma mistura de revolta e nojo.

uma vontade de correr ou fugir ou arrancar com as unhas a pele das pessoas, desse mundo, da gente.

laura nissei.
(laurinha_ni@hotmail.com)

João said...

belo texto!