eu tenho um problema. aliás, dois.
o problema número 1 é: os meninos nunca fazem nada. apesar de receberem um ticket mensal que dá direito a usar toda a linha de transporte público, eles estao sempre em casa. os compromissos deles se resumem em ir ao médico e ao psiquiatra, e às vezes à ong que os orienta. ou seja, nao existe uma rotina preu fotografar. e o lazer deles nao inclui a cidade, o mundo lá fora. eles ficam em casa no facebook. e na casa deles eu nunca posso ir - toda vez que sugiro, a casa está suja, o gato está doente, o landlord vai fazer uma visita. entao, até agora, estou vivendo de "pautas", coisas que eu sugiro, porque simplesmente nao sei mais o que fazer. sugiro de irmos tomar um café nao sei onde, de irmos ao centro ver as pessoas, de ir no parquinho. mas isso nao diz nada sobre eles, nem sobre mim, e eu estou totalmente perdida. nao quero que meu projeto seja sobre dois transgender e uma fotógrafa dando rolê em berlim.
o outro problema é o formato. tentei comecar com médio formato pra sair da minha zona de conforto, e porque eu acho que misturar formatos combina como o projeto. quando levei os primeiros resultados pra sala de aula, no entanto, alguns disseram que era interessante ver minha luta com médio formato, mas que eu nao sou boa nisso. outros disseram (incluindo meu prof. novo, ludwig rauch, que é maravilhoso apesar de nesse ponto eu nao ter concordado com ele) que era preu voltar a fotografar snapshot como fiz com vovó, e com mais humor (mas como, respondi, se a vida dos dois nao tem a menor graca pra eles...). outros falaram preu ficar com a câmera 35 mm. falaram preu comprar filmes melhores, falaram que minhas fotos têm "muito magenta", e nao têm foco. por alguns dias me preocupei com tudo isso, ai meus deus, fiquei neuvosa querendo fazer as coisas como nao gosto ou nao me interessa.
o ponto é: eu sei focar. eu sei que filtro usar pra corrigir uma determinada luz, ou que filme escolher pra tal luz. mas eu nao quero. já penso tanto em como inventar minha história, em como contar meu conto, já passo tanto tempo sofrendo, que acho que posso prescindir de alguns elementos. nao me entendam mal: eu tive que entender e dominar a técnica, pra poder abrir mao dela. nao sou leviana.
nesse dia desse encontro, mandei todo mundo mentalmente se fuder. segui usando meus filmes baratos, de cores erradas, foquei quando deu tempo ou eu me lembrei. no documentário sobre sibylle bergemann, a grande, ela diz: "se uma foco está focada, está. se nao está, nao está". hahahaha mais concisa impossível.
a situacao nesse dia 6 de maio nao era a mais perfeita do mundo, e eu estava meio entediada desse lance "um dia sem sol no parque com duas pessoas que eu nao conheco". eu nao faco a menor ideia se esse projeto presta, porque estou até agora nadando na superfície e quando enfio a cabeca, tampouco vejo águas profundas.
aos poucos vou vendo que, apesar de estar feliz de ter encontrado esses dois, se meus personagens nao me comovem ou nao me intrigam, minhas fotos nem me comovem, nem me intrigam.
11 comments:
talvez fotografá-los em algum lugar que não seja confortável para eles..
beijo, ivi.
talvez fotografá-los em algum lugar que não seja confortável para eles..
beijo, ivi.
"...se meus personagens nao me comovem ou nao me intigram, minhas fotos nem me comovem, nem me intrigam."
**qui lindo!
Oi Ivi,
um passo interessante, talvez , seja você começar a fotografar não somente os seus meninos. Pode ser que exista algo que em imagem interesse a eles. Acho que vc poderia experimentar provocar um deslocamento do assunto, trazê-los ao seu lado para julgar ou determinar o que seria posto na fotografia.
Até aqui tem fotos lindas. Talvez o desconforto que esteja procurando não vá se resolver pela troca de câmeras, mas pelo deslocamento seu e do obejto:
“na segunda vez que encontrei com miki e kai, dia 26 de abril, tínhamos marcado deu ir pra casa deles e a gente cozinharia, fofocaria e faria umas foto véia. eles moram muito longe, levei horas pra chegar e achar a rua ("horas", que drama) e quando estava quase na porta, miki manda um sms dizendo que eles tinham dormido demais, por terem dormido demais nao tinham arrumado o apê e nao queriam que eu subisse. entao era preu fazer o que? voltar pra casa? fiquei meio chocada. podiam ter me avisado um pouco mais cedo, em vez de desmarcar quando já estou lá”.
Existe essas fotos? Da rua, do endereço longe, do sumisso deles? As fotos que contariam que tá difícil...?
“perguntei como eles se sentiam com o povo olhando, se incomodava”.
Um povo olhando.
Vale uma coleção de retratos de pessoas olhando? E os três pegassem uma câmera e pedissem as pessoas para olharem para vcs? Um ensaio composto sempre por 3 retratos. A estratégia seria pendurar a máquina no pescoço e pedir para uma mesma pessoa olhar para cada um. No momento em que estiverem olhando, foto! Daí, 3 fotos juntas. Pode ser que nada mude no olhar das pessoas. Pode ser que mude um pouco, mas vc terá ativado uma discussão sobre ser olhado. Sobre o que acahamos que somos e o que somos pelos outros. Sobre o que vemos quando nos olham.
Já que são quietos, você se move e reiventa a rotina deles. Acho que vale tê-los sem necessarimente aparecerem nas fotos. Que até aqui estão lindas! Mas valeria fugir do somente tê-los em quadro. Eles devem saber contar uma história. Tem algo além de ser transgender, de aparetemente. Acho que vale atravessá-los, perpassá-los, tirar do trabalho essa lógica de uma câmera (digital ou elefantosa) entre você e o seus.
Quando escreves, costumas desrespeitar certas lógicas e te mostras que só. Uma forma de escrita que é deslocada, o assunto vem ao teu lado, nunca de um lá meio frio...Vais até e trazes em mãos por palavras recolocadas. E assim seria com fotografias. Esse assunto é antes teu que apenas de meninos na foto.
Que fotos estão no fecabook? Não há por lá cenas a se apropriar?
Um beijo! Sempre aprendo muito contigo, Pio.
É querida, se não "garrou amor" fica mais difícil, né? E vou dizer, essa frase sobre personagens que não comovem ou intrigam foi muito badass, amei! Fodona! :)
Não gostei Adelaide. É comercial de margarina? Tá feio. E falso. Não corresponde ao que você vem escrevendo e pensando sobre os dois. Não digo que as fotos precisam ser dramáticas, chocantes, tristes, porque eles já sofreram muito na vida. Mas acho que estão com cara de tumblr de adolescente, superficiais. Falta poesia. Falta um argumento, falta um ponto principal. E ele está aqui: “uma ausência de paixao, uma ausência do que fazer que não ajuda ninguém.” (work in progress #8)
r., uma pena você nao se identificar. se o tivesse feito poderíamos trocar ideias.
beijos
pio, maravilhoso teu comentário, muito iluminativo, muito inspirador.
tu sabe que na aula de avaliacao final, do ano letivo passado, um dos meus profs falou que eu penso como escritora, e nao como fotógrafa. eu fiquei com isso muito presente na cabeca, e agora quando vou fazer fotos tento pensar como fotógrafa e tem sido tao mais difícil. talvez eu devesse voltar a fotografar como quem escreve, né?
beijo, pio, brigada por tudo!
Das tuas questões todas, a que eu mais achei relevante foi a tua sensação de incomodo com o vazio, parece que tu não consegue chegar a um ponto de entendimento.
Passei por isso, mas no meu caso quanso precisa de textos, uma quantidade gigante deles.
Não sei se ajuda, mas tentei me impor em casa um deles, por a minha identidade, e que se não identificassem qualquer coisa, qualquer fundamentação, qualquer embasamento, que conseguissem me ver, em cada linha. Na forma grave de trazer os assuntos, na forma clara e sem rodeios. Se tu sabe o que quer, sabe o filme e foco a usar, e se as criaturas não cooperam, troca eles, troca se ainda for tempo, manda eles a pqp e vai ser feliz com gente que coopera. ;) beijo e boa sorte, e nos mais, até agora as fotos estão tri massa.
Não, tenho medo de vc.
eita, realmente muito maduro de sua parte vir aqui, dizer apenas que as fotos estao feias e alegar que nao se identifica nao por sua covardia mas por medo de mim hahaha tenha dó!
foda é imaginar que você deve ser uma das poucas pessoas para as quais mandei email pessoal pedindo opiniao.
uma pena que por sua covardia ou má educacao ou tédio você interrompa uma conversa que ao menos para mim poderia ser enriquecedora. se bem que, agindo desse jeito, eu duvido muito que seus conselhos viessem a me interessar.
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