eu tarra de boas na minha, na boa, era assim
tu tarra na merda atrás dum amor sem graça ou uma trepada ruim,
porra então tás reclamando de quê?
tás se sentindo na merda, né?
tu curtia as coisa que eu tinha pra dar
e se divertiu com a coisa que eu dava
mas meu filho não viaje
tu foi só mais um na minha lista
dos que tentam animar a vida com uma "doidinha"
ninguém te avisou que eu sou mais que isso?
foda-se tua carruagem teu cavalo branco
aposto que tu nunca pensou nisso
mas eu nunca disse que tu me tinha
tu que precisou de mim
sim foi tu quem precisou de mim
sinta mais e dê menos
eu sei que tu odeia admitir
mas meu filho, quem foi?, foi tu que precisou de mim
tu fica me enrolando nesse caralho enquanto eu arraso
arraso e lacro
foda-se essa merda que num era pra dar certo
a gente não era porra nenhuma
tô lhe dando a real pra você ficar ligado
então comé que tu se sente, comé que tu se sente?
a gente tá cansado de saber que toda música pop em inglês, quando traduzida pro brasileiro "oficial", sempre se parece com alguma música ruim de zezé di camargo and luciano.
outra coisa que eu tô cansada de saber é que, quando chega-se ao ápice (ou ao fundo do poço) de se traduzir rihanna pro brasileiro é porque a pessoa tá mesmo vuduzada.
na verdade, eu queria apenas uma desculpa pra publicar essa música em forma de indireta, no facebook. mas fiquei com vergonha, porque é muita passação de recibo, e no fim das conta os destinatário dessas indireta, os boy, tão cagando e andando pra remetente.
então achei mais erudito fingir que tô fazendo um experimento com a língua brasileira, traduzindo do inglês estadounidense negro para o recifês.
tem duas coisas importantes pra mim nesse exercício: a relação com o dialeto (estou absolutamente convencida que o recifês é mais do que um sotaque, mas imagino que linguistas diriam que não) e a abordagem da sexualidade da menina "doidinha".
e a letra se aproxima também de duas coisas sobre as quais, enquanto brasileira e mais precisamente brasileira do nordeste (esse lugar super machista), penso muito: o sexo da mulher fora relacionamento estável and/ou monogámico e o rótulo da menina "doida". um termo tão, mas tão (mal-)usado: como se a auto-suficiente e sexual não pudesse ser "normal". não. a que não dança conforme a música só pode ser doida.
no texto original, rihanna usa os termos "bad bitch" (que eu entendo como a "doidinha") e "savage", que é uma palavra mais antiga, e mais neutra, que eu não traduzi como selvagem porque
1) é brega (coisa que a letra não é)
2) porque entendi como sendo o momento em que rihanna diz que não é "bad", e sim muito maior que isso.
quando prestei atenção nessa letra pela primeira vez, além de ter me identificado com o pé-na-bunda indireto (porque, convenhamos, ainda que ela esteja dando a real, ainda que o texto seja empoderado, me parece que quem não quis ela foi ele), me identifiquei como mulher-não-branca-vivendo-na-alemanha e o male gaze europeu.
ainda que mais igualitária do que os relacionamentos que eu tive com brasileiros, minha relação com um homem branco europeu sempre será permeada de um certo exotismo, fetiche muito sutil, mas que está lá como os fantasmas de bolaño. quando rihanna diz "tryna fix your inners issues with your bad bitch" eu só consigo pensar em "tentando animar sua vidinha de europeu com uma latina 'doida'".
no imaginário criado por rihanna para a música, minha teoriazinha de merda da mulher não-branca sob o male gaze branco se desfaz e é um tapa na minha cara. o mundo de rihanna é negro, é, no sentido racial, totalmente igualitário.
o boy ao qual ela se refere, ainda que eu tenha visualizado na forma de um homem branco delicado com mommy issues (perdão!), é um gangsta insensível e tatuado que ela mata com três tiros num clube de pole dancing. todo mundo parece ter dinheiro, ter a mesma cor da pele, ser mais ou menos igual (no sentido de raça e classe), o que só confirma que o que rihanna aborda na letra é realmente a vida interna dos envolvidos, e não aquilo que eu achei que fosse, na minha interpretação white girls problems da letra.
de robe, com os peito não-siliconado (amém!), rihanna mata o boy capricorniano, mas com quem ela tá em pé de igualdade socialmente. nessa hora, uma imagem resume pra mim o desencontro entre o que rihanna diz e o que eu entendi: pendurados no pescoço dela, um colar de pérolas apertado e curto, fetiche-acoxinhado, e um colar de ouro longo, com um pingente em formato do continente africano. pá.
essa letra é maravilhosa. o anti é um disco todo errado, de frustrações e tropeços. rihanna, ao contrário de bioncê, erra, e é por isso que esse disco pega na nossa mão mais do que o lemonade (no quesito amor, claro, porque no quesito político, né, migas, tá pra nascer um disco mais importante que o lemonade). agradeço a deus pela graça alcançada que é esse disco fuderoso.
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