Me mostra as palmas das tuas mãos
Para S.
Na tua frente uma janela.
Um fotógrafo recita um poema
que fala sobre saudade.
Bebem café com os corpos nus.
Olha, te digo, o dia
nasce e é rebelde.
Cansados de tanto vazio,
conhecem as vozes,
o peso do passado,
o cansaço da vida e da beleza.
Quão obsceno o amor na imperfeição,
quão pura a verdade
que é esquecimento para os abandonados
que tentam se amar descalços e sem promessas.
A manhã é a festa sem rumo no céu
e esse espelho quebrado que em pedaços insinua
quem foste, quem hoje pareces ser,
que és tudo o que sobra.
A manhã conhece igualmente dor e abismo.
Vem, me dá a mão,
quero voltar a viver apesar de tudo
com a força do medo e da derrota.
Vem, me mostra as palmas das tuas mãos,
quero que ao me olhares eu saiba
que diferença há
entre um fotógrafo e um poeta,
entre mancha de azeite e água limpa,
entre o horizontal e a curva.
Quero saber se nesta manhã cabe
um lugar de júbilo inventado a base de ternura
para nos olharmos depois.
Quero saber se um fotógrafo sabe olhar
sem uma câmera com a qual capta
momentos tristes.
Quero saber o que responderias
se te digo
que esta manhã me parece
uma lenta batalha entre o amor e a fuga,
uma luz tênue que se apazigua.
berlim, verão de 2010
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